16 fevereiro, 2017

A VIÚVA E A TREPADEIRA

Por:
Sônia R.Andruskevicius de Castro
Regional SÃO PAULO
E-mail: dra.andrus@globo.com









Acordou bem cedo como todas as viúvas gostam de acordar. Ainda na cama seu pensamento concentrou-se no que faria naquele dia. Um raiozinho de sol entrava pela janela, anunciando que o dia poderia ser muito bem aproveitado com afazeres externos e foi quando veio a grande ideia: podar a trepadeira do jardim. Naquela época do ano não havia uma única folha sequer e  era preciso tirar os galhos mais velhos para que ela voltasse a brotar linda e majestosa.

Imediatamente pulou da cama, não como pulam da cama os mais jovens mas como a idade lhe permitia e começaram os preparativos. Uma calça escura, destas o que tempo esqueceu de destruir e que fica guardada para serviços gerais foi prontamente retirada do armário juntamente com aquela camisa que também fazia parte da indumentária para estas ocasiões.

Devidamente paramentada partiu para o quintal em busca da escada que não precisaria ser aquela que alcança o telhado,  pois a trepadeira não tinha igual altura. Bastaria uma escada de poucos degraus como a usada para se alcançar roupas no maleiro do quarto. Cinco ou seis degraus seriam suficientes mesmo porque era o máximo de altura que se arriscaria a subir. O alicate cortador, um saco de lixo grande e nada mais. Um serviço bem simples que seria executado rapidamente.

Abriu a escada, que era daquelas que formava um triângulo no chão como devem ser todas as escadas que fornecem segurança para as pessoas subirem mesmo que tenham passado da idade de subir nelas. Já no topo dela olhou a galhada seca e pensou por onde começar. Um emaranhado sem começo e fim.

Respirou fundo, ajeitou os óculos e tentou aleatoriamente fazer o primeiro corte. O galho partiu-se  mas ficou no mesmo lugar enrolado entre os outros. Arriscou mais outro corte e de novo nada caia ao chão. Tentou mais uma vez, e outra e mais outra. Os galhos permaneciam suspensos como se não quisessem cair por terra e a viúva não sabia mais onde cortar, onde estava o fio da meada de tão intricada natureza.

Assim olhou para seu cachorro São Bernardo que com seu olhar de interrogação também estava surpreso não tanto pela teimosia da planta  mas pela situação inovadora de vê-la suspensa daquela maneira e a melhor ideia surgiu. Cortou a planta próximo ao chão e puxou a galhada.

O cachorro saiu correndo, parou distante e arriscou olhar. A viúva estava vestida de planta. Galhos na cabeça escorriam pelos braços enquanto se debatia para livrar-se de tal incômodo ao mesmo tempo palavras inéditas saiam de sua boca. Aproveitou o alicate cortador e fez em pedaços os maiores.


Ensacá-los não foi tarefa fácil também, pois como todo galho seco teimoso  tentavam escapar rasgando o plástico e para complicar ainda mais a situação seu cachorro curioso, sentindo-se livre do perigo, cheirava sua dona e babava sua imensa baba na calça preta que afinal era guardada para estas ocasiões.


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