A noite cai trazendo no colo
as estrelas com olhos de prata.
Anunciam a riqueza do momento vindouro.
O dia foi intenso,
vasto de brincadeiras da infância lasciva.
Teve a pipa, a finca, a pelada,
o pião e o nego fugido.
Foi como a Passárgada de Bandeira
sem as prostitutas e a mesa do rei.
Mas teve a alegria, a amizade e
a roda dos sonhos impossíveis.
Depois à casa para o banho,
os deveres da escola,
ouvir pelo rádio a novela de Jerônimo.
A seguir, a mesa posta para o lanche.
À sua cabeceira senta-se meu pai que,
naquele momento, queria contar-nos uma estória.
Estória que não passava de uma só.
A única que sabia contar.
A única que valia por mil.
Aquela ouvida na infância,
agora com emoção renovada,
como se fosse outra.
Nós outros na cadeira disputada
para ficar-lhe mais próximos.
O encanto remoçava o recontar.
E lá ia ele medindo palavras e pausas.
Afinado nas falas, trazia para o presente
as personagens da estória.
Tudo parecia verdadeiro.
Zir conseguia matar os leões
e retirar-lhes as cabeças
para a construção do castelo.
(Sim, sua moradia era feita de cabeça de leões).
Cavalgava o muro de pedras.
Esporava-o para fortalecer-se,
tanto os braços quanto as pernas.
Depois, o cavalo aprontado
no campear do deserto insólito.
Preparava-se para a luta contra os opressores.
Lá vinha ele, lança em riste,
golpes certeiros e força hercúlea.
Vingava parentes feridos ou mortos
na ignominiosa perseguição.
No encanto de ouvi-lo,
ia-se um par de horas.
A história, infelizmente, findava -
tão absorvidos estávamos!
E a noite estava apenas começando...
Muitos sonhos viriam
e nas décadas vindouras.
Sua História traria no âmago
a aspiração maior do Homem:
O anseio por liberdade.
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