18 outubro, 2017

RÉQUIEM AOS QUE PARTIRAM

Por:
Josyanne Rita de Arruda Franco
Regional SÃO PAULO
E-mail:  josyannerita@gmail.com











Tenho alma de poeta, às vezes não merecendo tê-la. 

Contento-me com a observação silenciosa das expressões agressivas e dos discursos vazios, sem enfrentar a celeuma das imposições de ideias que maltratam minha sensibilidade. 

Prefiro escutar... Ajudar quando possível, tentar sanar dores do corpo e da alma, deixando que cada um encontre o eco de seus pensamentos quando começar a deixar de ser narciso.

Então, sempre questiono a mim e tão somente a mim sobre o sentido e o significado do que vi ou vivi, pois foram minhas as expectativas e são meus os fantasmas da memória. 

Por isso abracei a poesia e escrevo usando muito as reticências... Para mim, sempre foram melhores que pontos de exclamação. Posso deixar em aberto o que virá, brincar com o que foi ou poderia ter sido. Na metáfora da vida, à espreita estará o ponto final, espantando aspas e vírgulas. 

A vida nos prepara caminhos para bons percursos na companhia de outros, mas também oferece grandes distâncias solitárias... E sempre que alguém se despede da vida, penso que esteve sozinho, às cegas, tateando o barulho do viver para encontrar saída, mas não há saída que encontre a infinitude... O caminho é inexorável para o fim de tudo, apagando lembranças e afetos. O resto vira história. 

O corpo alquebrado por dores e paixões, sucumbirá nos estertores do último fio de esperança... E seguirá sozinho pelas veredas escuras do indecifrável mistério. 

Assim, melhor é decidir não ter ideia formada, concreta, rígida e inflexível. Abrir-se às experiências, mesmo que elas pouco acrescentem. Embates são desnecessários se configuram gritos irascíveis no vazio das argumentações. 

Nos últimos trinta dias, vários amigos queridos partiram para onde não conhecemos. Cerraram os olhos depois de tantas batalhas insanas entre poucas horas de sono, muitas de trabalho, grandes renúncias, ausências nos eventos de família, remuneração inadequada e falta de reconhecimento. Eram todos médicos... Tinham menos de sessenta anos... 

Não chegaram sequer a experimentar o sabor da cultuada melhor idade. Quais terão sido seus últimos pensamentos? Teriam eles ouvido o barulho distante dos corredores lotados de doentes, o ritmo frenético da correria nos pronto- socorros, a sirene das ambulâncias e o choro de dor de tantos eventos tristes? As vibrações felizes que novas vidas chegando trazem às salas de parto? A comemoração contida pelos procedimentos cheios de sucesso? 

Talvez nada disso... Talvez tudo isso e o mais importante: a lembrança do olhar amoroso daqueles que continuarão a missão terrena de fazer frutificar a dedicação, o amor ao próximo e à família que, para o médico, é sempre estendida para além do círculo nuclear de imorredouros afetos. É a família composta de amigos, colegas, pacientes e de todos os colaboradores que caminharam em parceria com a preciosa vida que se foi e deixou um vácuo de humanidade... requiem aeternam



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